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O impacto da guerra nos mercados financeiros: parte I

2022.3.7 Vítor Ribeiro, CFA

Os últimos meses foram marcados por preocupações em torno da inflação e taxas de juro, ou seja, pela política monetária. Os bancos centrais estavam, mais uma vez, a assumir o protagonismo e os mercados financeiros instáveis com a incerteza e possíveis erros na concretização dessa política. 

Neste artigo de janeiro sobre o posicionamento da carteira de investimento, referi-me ao enquadramento geopolítico e à repressão financeira como fatores fundamentais, a par de outros, para a composição de uma carteira de investimento. Estava longe de antever um evento da magnitude da inacreditável e violenta invasão da Rússia à Ucrânia. 

A geopolítica é, em última análise, o estudo do equilíbrio entre opções e limitações, entendida como o estudo de como a geografia (o “geo” na geopolítica) influencia as políticas internacionais dos países e sociedades (a “política”).

E eis-nos numa numa profunda crise social e humanitária, para além de política e económica. Acompanhamos a guerra e outros eventos geopolíticos em tempo real, bem como os mercados financeiros. Olhamos para o monitor à espera de uma novidade, da flutuação dos títulos, de um motivo para agir, dos últimos ataques, esperando que a nossa atenção ajude no desenrolar dos acontecimentos. A vida é mesmo vivida em tempo real. Tanto que às vezes mais parece uma simulação matemática cheia de coincidências, grandes ciclos, eternos deja-vus, como se vivêssemos sempre presos ao passado ou em alarme consciente – uma falha da Matrix?

 

Da geopolítica à geoeconomia

Devido à (ainda) integração da economia mundial, ao papel dos fatores económicos na preponderância estratégica de um país ou bloco regional, aliado a esta vivência contínua e partilhada em redes de comunicação e de dados, nasceu um novo ramo da geopolítica: a geoeconomia. A política é essencialmente a batalha entre diferentes narrativas. A economia também engloba narrativas e história. Apesar de darmos muita importância ao elemento quantitativo, é óbvio que para avaliarmos o ambiente macro ou um determinado ativo financeiro precisamos dessa análise quantitativa, mas também de história, da narrativa que suporta a nossa análise - tal como defende Aswath Damodaran.

A consolidação deste caminho verifica-se, por exemplo, pela importância da Alemanha no mundo e, principalmente, na construção da União Europeia, mas também em instituições como o FMI, o Banco Mundial - dominados e incentivados pelos EUA - e a Iniciativa da Cintura e da Rota ou Banco asiático de investimento em infraestrutura – impulsionados pela China. Sim, os blocos opostos China-EUA também se revelam no seu papel económico, na geoeconomia. O poderio económico tornou-se tão essencial quanto o militar na estratégia política de supremacia e domínio.

Como refere Ray Dalio no seu novo livro, Principles for Dealing with the Changing World Order, há sinais de mudança na ordem mundial. Neste documentário sobre esse livro, Dalio refere como aprendeu a antecipar o futuro estudando o passado. Segundo o autor, o mundo deve esperar uma nova ordem, ou seja, uma nova forma de supremacia e domínio que bem pode passar pela China.

 

Do evento geopolítico à volatilidade

Com o despoletar de um evento geopolítico, a volatilidade aumenta. Esse aumento de volatilidade não significa, porém, um aumento da expectativa de rentabilidade. É comum ouvirmos dizer que “quanto maior o risco, maior o potencial de rentabilidade”. Sem dúvida. Mas para analisarmos este conceito, temos de separar o risco da volatilidade. 

Um aumento da volatilidade, ou seja, um aumento da taxa de variação do preço de um ativo financeiro num determinado período de tempo, significa, normalmente, maior risco. A verdade é que um aumento da volatilidade está normalmente associado a um mercado descendente. Esta queda é também um momento de oportunidade e rebalanceamento da carteia.

Ao olharmos para a volatilidade podemos recorrer ao VIX (Cboe Volatility Index). O VIX é um indicador de curto prazo calculado com base na volatilidade implícita de uma opção a 30 dias e não incorpora riscos de longo prazo como os riscos e eventos geopolíticos e económicos. Dá-nos uma perspetiva instantânea do sentimento atual. Mas também podemos analisar a volatilidade histórica com base no conceito estatístico da variância, ou seja, do desvio dos retornos periódicos em relação à média num determinado período. Esta volatilidade, quando analisada em períodos longos, tende a ser um indicador com algum valor preditivo.

Se no início do ano estaríamos com dúvidas sobre a continuidade do crescimento económico, agora parece ainda mais questionável essa possibilidade, pois as sanções aplicadas à Rússia e todo o ambiente devastador de uma guerra vai trazer graves repercussões à economia mundial. As disrupções ao nível energético e alimentar, o adiamento de investimentos e de reformas estruturais e o medo com a possível escalada do conflito criam um novo cenário para economia mundial e o acentuar da repressão financeira. Ou seja, da dificuldade dos investidores para investir as suas poupanças com a expectativa de retorno acima da taxa de inflação ou até positivos no futuro próximo.

Esta situação vai requerer ainda mais aquilo que temos vindo repetir no blog da Future Proof: paciência, otimismo e capacidade de poupança. Porque nesta fase faremos várias perguntas retóricas: Estaremos confortáveis em iniciar ou reforçar uma determinada carteira de investimento num momento crítico, no deflagrar de um evento? Devemos mudar a estratégia de investimento atual? A política de investimento deve ser atualizada face aos novos acontecimentos?

A verdade é que perante todo este cenário, passaremos, com certeza, por uma fase de queda nas valorizações dos ativos que pode ser mais ou menos pronunciada dependendo, principalmente, da escalada do conflito e do impacto do mesmo na economia.

De qualquer forma não podemos deixar de parte o futuro. Ao longo da existência humana, a evolução tem sido avassaladora. Desde a linguagem, passando pela agricultura, indústria, tecnologia, até à revolução digital e a evolução ao nível da saúde e educação, por exemplo. Vivemos cada vez melhor. Por cada crise, guerra, catástrofe natural ou pandemia que passamos, o futuro tende a ser melhor. Há esperança. Haja confiança!

Mas o pânico generalizado numa situação limite é uma constante. As emoções ganham à razão e da mesma forma que compramos por impulso, parece que decidimos vender ainda antes desse impulso. As narrativas podem mudar rapidamente. O sentimento também.

A lição para nós, investidores, é que devemos ser extremamente cautelosos recordando que tomadas de decisão por impulso e com foco no curto prazo pode ser devastador no longo prazo.

Paremos para pensar. Olhemos para o nosso plano e para a nossa política de investimento:

  • Os nossos objetivos foram alterados?
  • Como está a nossa situação pessoal e profissional?
  • O nosso horizonte temporal de investimento foi alterado?
  • Temos flexibilidade para alterar os nossos objetivos e preferências?

 

Ler mais sobre este assunto em O impacto da guerra nos mercados financeiros: parte II

Vítor Ribeiro, CFA
Vítor Ribeiro, CFA

Vítor é um CFA® Charterholder, empreendedor, melómano e com um sonho de construir um verdadeiro ecossistema de investimento e planeamento financeiro ao serviço das famílias e organizações.

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